A presidenta Dilma Rousseff (PT) e o
senador Aécio Neves (PSDB) protagonizaram um enfrentamento duro na noite desta
terça-feira (14), no primeiro debate televisivo do segundo turno das eleições
presidenciais, realizado pela TV Bandeirantes. Mais agressivo, o tucano
utilizou cinco das seis perguntas a que teve direito, com tema livre, para
criticar o governo petista: abriu acusando a campanha adversária de promover
ataques "cruéis", e na sequência criticou o desempenho da economia,
repercutiu denúncia de uma revista semanal sobre a Petrobras, acusou a campanha
petista de mentir sobre sua posição em relação ao Bolsa-Família e lamentou a
"baixíssima qualidade" dos serviços públicos proporcionados pelo PT.
Dilma, por sua vez, buscou embutir em suas
perguntas comparações entre os governos de Fernando Henrique Cardoso (PSDB,
1995-2002) e os governos de Luiz Inácio Lula da Silva (PT, 2003-2010) e dela
própria para criticar o modo de governar adversário. Ela pareceu elevar o
tom seguindo as investidas do adversário: em três das seis oportunidades de
questionamento direto a Aécio abriu combate aberto ao tucano, acusando seu
partido de retirar R$ 260 bilhões da saúde com o fim da CPMF, relembrando o
caso do aeroporto construído com dinheiro público em terras de parentes de
Aécio em Minas Gerais e destacando o baixo índice de conclusão de inquéritos
pela polícia mineira. Em uma de suas respostas, Dilma acusou ainda o tucano de
nepotismo, por ter abrigado no governo de Minas Gerais "uma irmã, dois
tios e um primo".
O momento mais tenso, no entanto, ocorreu
em uma pergunta aparentemente inofensiva: no início do terceiro bloco do
debate, após um segundo bloco especialmente agressivo em que o tucano acusou a
candidata de "leviana", Dilma fez uma pergunta a Aécio sobre o
combate à violência contra a mulher.
Aécio, que manteve ao longo do debate
postura irônica em relação a Dilma, reagindo às manifestações da presidenta com
risos por diversas oportunidades, mudou. Sério, buscou com os olhos a
apoiadores na plateia e respondeu de forma hesitante: sobre a possibilidade de
que o corte de ministérios defendido pelo PSDB pudesse vitimizar a Secretaria
Especial de Políticas para as Mulheres, criada no governo Lula, Aécio concedeu
que pode mesmo tentar aplicar políticas para a área sem centralizar sua
formulação e aplicação, deixando em aberto a sobrevivência da SPM, que tem
status de ministério. "Temos de avançar no apoio aos estados e municípios,
que não têm tido apoio necessário, seja no disque-denúncia, nas delegacias
próprias", afirmou.
Para a campanha tucana, no entanto, é mais
preocupante o paralelo entre a questão encaixada por Dilma exatamente após um
bloco de troca de hostilidades com o tucano e a denúncia do jornalista e
blogueiro Juca Kfouri, publicada em setembro de 2009, de que o então governador
de Minas Gerais teria agredido com um tapa e um empurrão contra a mulher que o
acompanhava em um evento da empresa de moda Calvin Klein no hotel Fasano, no
Rio de Janeiro, diante de diversas testemunhas. A postagem de Kfouri ressalta
que a assessoria de Aécio nega a história, mas o jornalista mantém a denúncia,
intitulada Covardia de Aécio Neves, inalterada em sua página. O tema
antecedeu a única questão sem ataques feita pelo tucano, sobre investimentos em
educação.
Desde quando governador e mais intensamente
desde o início da campanha, Aécio tem sido obstinado em controlar a repercussão
de notícias negativas sobre sua campanha e sua vida pessoal nas redes sociais e
nos mecanismos de busca. Embora tenha conseguido decisão judicial para bloquear
buscas no Google, o senador mineiro falhou em processo que pedia investigação
de 66 twiteiros que compartilhavam material contrário a sua candidatura.
Bem-estar social x 'meritocracia'
Aécio insistiu, ao longo do debate, no
discurso pessimista em relação à economia. Com ênfase no estouro da meta de
inflação e em um horizonte de alta do desemprego causada por
desindustrialização, o tucano chegou a convidar Dilma a pedir desculpas pela
administração da política econômica. A defesa da presidenta centrou-se na
figura de Armínio Fraga, presidente do Banco Central durante o governo FHC e
"prometido" ao cargo de ministro da Fazenda em um eventual governo
tucano. Para marcar a diferença entre os projetos políticos das duas
candidaturas, Dilma relembrou o áudio de uma entrevista em que Fraga dizia que
"não sobraria muito" dos bancos públicos após os ajustes que ele
considera necessários.
"Ora, hoje o BNDES [Banco
Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social] é o terceiro banco de
investimentos do mundo. Empresta para indústria e infraestrutura. O Banco do
Brasil é o banco que faz toda a política para o setor agrícola: dos R$ 180
milhões hoje emprestados, quem faz a maior parte do crédito é o Banco do
Brasil. A Caixa, eu fico impressionada... sem a Caixa, não tem Minha Casa,
Minha Vida", resumiu Dilma. Ela ainda lembrou que, durante o governo do
PSDB, a inflação esteve fora da meta por dois anos consecutivos, e que a taxa
Selic chegou a 45%, cenário econômico que se complicou e elevou o número de
desempregados a 11,5 milhões de pessoas em 2002, às vésperas da primeira
eleição vencida por Lula.
Se Dilma foi mais eficiente ao rebater as
críticas do tucano à economia com um portfólio extenso de programas sociais
para blindar o trabalhador diante de uma crise sistêmica, Aécio encontrou seu
melhor discurso se aprofundando na defesa de valores à direita: com elogios ao
sistema de meritocracia implantado em Minas Gerais, o candidato prometeu levar
ao serviço público a cultura de remunerar financeiramente resultados obtidos
pelos funcionários. Dilma tentou desconstruir o discurso tucano apontando
falhas de gestão que levaram à dispensa de quase 100 mil servidores da
educação, mas teve de ser lembrada que o PT aprovou aquele projeto. Nesse
embate, Dilma cedeu pela única vez em sua estratégia de demarcar diferenças de
projeto com seu adversário: quando o tucano tentou puxar para si a causa da
flexibilização do currículo do ensino médio, Dilma fez questão de dizer que a
proposta é, na verdade, sua.
'Comandante'
Aécio consolidou a guinada à direita de seu
discurso na reta final do debate, quando foi provocado a falar sobre segurança
pública: após defender a gestão do PSDB sobre as polícias civil e militar em
Minas, o tucano foi enfático em dizer que terá postura radical contra o crime
ao prometer assumir pessoalmente o "comando" de uma nova política
nacional de segurança pública, assunto, para o candidato, também relacionado às
relações internacionais. "Vamos enfrentar de forma altiva os países que
produzem as drogas que causam mortes no Brasil", afirmou.
Dilma, por sua vez, também apresentou
medida radical para lidar com o tema: defendeu a mudança da Constituição para
que o governo federal passe a compartilhar a responsabilidade pela segurança
pública e instale gabinetes integrados nos moldes dos criados para a Copa do
Mundo, com colaboração entre polícias estaduais e federais, além das Forças
Armadas.
Em sua fala final, Aécio prometeu honrar
compromissos firmados com Marina Silva (PSB) e fez agradecimento à viúva de
Eduardo Campos; no discurso de abertura, já havia estreado o discurso
"marineiro": o tucano afirmou que seu governo não representará o
projeto de um partido, mas de uma coligação que responde "ao sentimento
das pessoas", por um "governo generoso". A presidenta, sempre
solicitando ao eleitor que faça a comparação entre os projetos, pediu ao
trabalhador que se pergunte quem representa o projeto que mais defende
direitos.
Fonte:
Revista Exame
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